O coração da coisa

Uma coisa que me chama a atenção quando criticam o OLPC é como o pessoal fala em hardware subdimensionado, em sistema capado, em “roda Linux, devia rodar Windows!”. Um exemplo é esse artigo do Carlos Rocha para o G1, onde ele coloca entre outras coisas que as crianças receberão “um notebook funcionalmente limitado”. Ok, agora a pergunta: o que ele quer dizer com “funcionalmente limitado”? Vamos partir do princípio que essa máquina é para séries iniciais, logo o computador tem que ser voltado para esse público. Por exemplo, quem já passou pela experiência de dar aula de informática para crianças sabe que um editor de texto como o Word mais atrapalha do que ajuda (às vezes é melhor ensinar o básico no Write do que entrar naquele canhão para matar passarinho que é o Office). E a máquina é pensada para o ensino infantil, sim. O quê? A interface poderia ser mais cheia de coisinhas bonitinhas para encher os olhos da criança? Ora, até poderia, mas será que do ponto de vista pedagógico isso seria o melhor? Será que não ia distrair o aluno do que é realmente importante?

Outra questão do OLPC diz respeito ao sistema operacional. Os criadores do Cowboy criticam a opção Linux dizendo “o mundo é Windows”. Não vou dizer que eles não estão certos, que de fato, quando uma pessoa vai procurar emprego, vão perguntar “Você sabe Windows?”, mas o caso é que nem mesmo no Cowboy as crianças vão aprender a trabalhar com o Windows, já que o Windows CE é, quando muito, um Windows Lite. O foco na verdade é definir o que é “ensinar informática”: é ensinar a mexer com um programa ou aprender a usar os recursos informáticos como ferramentas? Eu acredito que é a segunda opção, e quem procurar olhar a base do projeto educacional do OLPC, que é construtivista, verá que a mesma não está centrada nem no Linux nem no Sugar (ou seja, não é focada no ambiente operacional), mas sim no Squeak Etoys.

Oras, o que é o Squeak Etoys? O Squeak é uma implementação do Smalltalk sendo utilizada como uma ferramenta de autoria de mídia, um ambiente modelador, onde todos os objetos criados têm comportamento programável diretamente dentro desta mesma interface. O Etoys é uma extensão do Squeak que inclui gráficos 2D e 3D, imagens, textos, apresentações, web-pages, videos, som e MIDI e por aí vai. O Etoys tem a habilidade de compartilhar áreas de trabalho com outros usuários Etoy em tempo real. E é totalmente programável. Como se pode ver é um recurso bastante poderoso para educação, não ficando limitado na equação “navegar na web + editar texto + desenhar figurinhas” que tem aparecido em muitos artigos que criticam a proposta metendo pau no equipamento. Aliás, outra coisa: o Squek Etoys é multiplataforma, rodando tanto no Linux como no Windows, seja ele o XP seja ele o Windows CE. Ou seja: ele roda inclusive no tal do Cowboy…

Então, vamos combinar o seguinte: quando se for escrever um artigo sobre o OLPC que tal levar em conta os aspectos pedagógicos por trás (ou seja, que softwares serão utilizados, e como serão), a visão de que a máquina é um computador para ser usado por crianças não por adultos (logo com necessidades de programas bem diferentes) e que o projeto por trás é multiplataforma, que o sistema operacional é mais um caminho de acesso para o sistema principal do que o ator principal de toda a história? Isso pouparia a gente de perder tempo vendo ataques que parecem mais motivados por interesses econômicos que educacionais…

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